Vendas do híbrido plug-in Song foram as que mais cresceram no bimestre (Foto: Divulgação/BYD)
Vendas da marca chinesa crescem 56% no primeiro bimestre, quase sete vezes acima da média geral de 8,6% no período
A voraz estratégia comercial da BYD, que desde o ano passado fez do Brasil o seu maior mercado fora da China, capturou a maior parte do crescimento do mercado brasileiro de veículos leves no primeiro bimestre deste ano. Enquanto as vendas totais de 333,7 mil automóveis e utilitários em janeiro e fevereiro representaram expansão de 8,6% sobre iguais meses de 2024, os emplacamentos da BYD registraram avanço quase sete vezes maior, de 56%, somando 15,6 mil unidades.
Com este número pode-se dizer que a BYD tomou 60% do crescimento das vendas no bimestre em unidades, que foi de 26,4 mil veículos leves em comparação com o mesmo período de 2024.
No ano passado inteiro a BYD vendeu 76,8 mil carros no País, com crescimento exponencial de 328% sobre o ano anterior. Sozinha a marca emplacou 16,7% de todos os veículos leves importados no Brasil – e por 64% de todos os emplacamento de importados vindos da China. Este ano o ritmo segue em aceleração.
Nos dois primeiros meses de 2025 a BYD aumentou em 1 ponto porcentual sua participação de mercado no País, de 3% em 2024 inteiro para 4% agora, subindo do décimo para o nono lugar no ranking das marcas mais vendidas.
As vendas do híbrido plug-in Song foram as que mais cresceram no bimestre: 71,5%. Com 5,9 mil unidades emplacadas o modelo foi o 23º veículo leve mais vendido do País e participou de pouco mais de um terço das vendas da marca. O elétrico Dolphin Mini somou 4,1 mil emplacamentos e ficou em 29º.
Estoques e distorção
Todo este desempenho meteórico nem leva em conta os altos estoques. Estimativas dão conta de que a fabricante chinesa tinha mais de 40 mil carros para vender parados em pátios de portos brasileiros na virada do ano, volume que foi inflado no segundo semestre, após a aceleração das importações em junho para evitar o aumento do imposto de importação sobre híbridos e elétricos ocorrido a partir de julho.
Para isto, segundo declarou à época o diretor de vendas Henrique Antunes, a BYD investiu R$ 10 bilhões para formar estoques com a alíquota menor – o valor é quase o dobro dos R$ 5,5 bilhões que a empresa anunciou que investirá até 2030 para montar carros em Camaçari, BA.
Visita técnica nas obras em Camaçari em 2 de dezembro (Foto: Governo do Estado da Bahia)
Os estoques caíram por pouco tempo com as vendas dos últimos dois meses, mas voltaram a subir no fim de fevereiro com a chegada de mais 5,5 mil carros da marca no porto de Vitória, ES.
Volumes estocados tão elevados acabam por gerar distorções no mercado, com ofertas de grandes descontos para desovar o estoque, que para alguns modelos que chegavam a R$ 30 mil no fim de 2024 – o que certamente deixou enraivecidos alguns clientes que pagaram mais por estes carros antes das promoções e ainda tiveram os seus usados desvalorizados de forma imediata e acima da média.
A estratégia de manter estoques elevados também atrasa a renovação da linha de produtos, que fica prejudicada pela necessidade de vender os modelos velhos antes da chegada dos novos, o que também acelera a desvalorização dos veículos da marca.
O prejuízo fica com o consumidor, já que a BYD parece ter larga margem para queimar, pois vende seus carros no Exterior por valores bem mais altos. Uma análise da consultoria Rhodium Group calcula que a BYD poderia cortar os seus preços em 30% na Europa e, ainda assim, teria o mesmo lucro que obtém na China.
O elétrico BYD Dolphin é vendido na China por 99,8 mil yuans, o equivalente a US$ 12,6 mil, enquanto no Brasil o modelo é vendido por mais que o dobro deste valor em dólares: com todos os impostos aplicados sai por R$ 159,8 mil, ou cerca de US$ 28 mil.
Exploração de importações
BYD Dolphin (Foto: Divulgação/BYD)
Ao que parece a BYD deverá aproveitar até a última gota do imposto de importação reduzido para elétricos, de 18%, e híbridos plug-in, de 20%, previsto para subir respectivamente para 25% e 28% em julho próximo. Este movimento deve provocar uma nova onda de formação de estoques antes do aumento – e não só da BYD; a conterrânea Omoda & Jaecoo, que pertence à Chery, recentemente embarcou 1 mil carros para o Brasil e outras marcas da China devem tomar rumo parecido antes da virada do semestre.
Dentre todos os maiores mercados de veículos no mundo as fabricantes chinesas encontram atualmente no Brasil uma das mais baixas barreiras tarifárias, o que estimula muito mais a importação do que a produção local, sempre prometida e atrasada enquanto for mais lucrativo importar do que produzir aqui.
Nenhum grande dano será causado aos lucros pelo atraso na construção dos novos prédios da BYD em Camaçari, provocado, por ironia, pela importação de 163 trabalhadores da China que foram trazidos pela construtora Jinjiang e mantidos em condições degradantes “análogas à escravidão”, segundo apurou o Ministério do Trabalho, que embargou as obras.
Antes disto a BYD prometia para agora, no começo de março, o início da montagem local de seus carros em SKD, chegados semidesmontados e em grande medida já manufaturados na China. Portanto nada mais seriam do que veículos importados apenas parcialmente montados no Brasil, com as bênçãos incentivos tributários dos governos federal e estadual da Bahia.
Se até trabalhadores a BYD importou para construir suas novas instalações no Brasil não se pode esperar nada muito diferente da produção local. Até o momento nenhum fornecedor local foi contratado.
A BYD recusou o pedido de fornecer informações sobre a atualização de seu plano produtivo no Brasil, mas é fato que o início da montagem local de partes importadas já foi postergado para o segundo semestre, talvez setembro, segundo notícias publicadas na imprensa recentemente.
Mesmo antes de eclodir o escândalo dos trabalhadores chineses a empresa nunca esclareceu como faria a contratação de 10 mil trabalhadores que prometeu fazer até agosto, nem como construiria 28 novos prédios em seu terreno na Bahia antes de concluir o primeiro, muito menos quais serão as operações nacionais.
Até o momento, portanto, a maior contribuição da BYD ao País foi na erosão da balança comercial com o escoamento de bilhões de dólares para a China, que seguirá assim se não houver nenhuma intervenção do governo brasileiro.