As duas maiores fabricantes instaladas no país deixaram claras suas posições antagônicas no processo de eletrificação local. Qual delas se dará melhor?
Semanas atrás, o presidente da Stellantis para a América do Sul, Antonio Filosa, concedeu entrevista coletiva a jornalistas para fincar a bandeira da empresa na defesa do uso do etanol como alternativa regional ao carro elétrico movido a baterias.
A fabricante mostrou, inclusive, números de testes que comprovariam que um Jeep Renegade movido a combustível E100 (etanol puro) polui menos do que um elétrico recarregado com energia proveniente de usinas a carvão, muito comuns na Europa.
“Alguns concorrentes podem pensar diferente e vão tentar defender seus interesses, mas nós consideramos já ter uma solução pronta para uso e muito mais eficiente para nossa realidade de mercado”, defendeu o chefão da maior fabricante automotiva em atuação no país.
No radar da Stellantis estarão modelos híbridos leves, híbridos plenos, híbridos plug-in (todos flex) e até um motor turbo de alta eficiência movido apenas a etanol, cujos possíveis segredos eu explico neste outro artigo. Os elétricos a bateria entrarão na equação como uma espécie de coadjuvantes de luxo.
Filosa não deu nomes aos bois, obviamente, mas estava claro que seu recado era para a vice-líder de mercado, GM (General Motors), que já declarou que não apostará em modelos híbridos. Em vez disso, fará a ousada transição direta dos automóveis a combustão para os totalmente elétricos.
Nesta semana, foi a vez de o presidente da GM na América do Sul, Santiago Chamorro, receber jornalistas para anunciar que a engenharia nacional da empresa já está se preparando para atuar em sinergia global no desenvolvimento de elétricos como o novo Blazer EV, que será lançado no Brasil ainda este ano.
Mais do que isso, Chamorro declarou com todas as letras que a fabricante americana pretende ser a primeira a “nacionalizar a produção” de veículos elétricos no Brasil, e que isso “não acontecerá em um futuro muito distante”. A marca enxerga Brasil e Chile, em específico, como polos importantes de extração de matérias-primas e produção de baterias e veículos elétricos.
É uma excelente notícia, pois essa transição direta dos automóveis convencionais a combustão para os elétricos poderia significar uma simples saída da GM enquanto fabricante local, do mesmo modo que a Ford fez em 2021. Pelo visto, não será o caso.
Afinal, se Chamorro disse o que disse, de modo tão explícito, é porque as negociações para um plano de investimentos nesse sentido junto à matriz já se encontram em estágio avançado. Isso se já não estiver consolidado, carecendo apenas de minúcias para ser anunciado, contemplando possivelmente a década de 2030.
Ou seja, enquanto a Stellantis vai pressionar o governo e o mercado para estimular o aumento da aposta no etanol – que, segundo Filosa, não é usado por quase metade dos brasileiros por questões puramente ideológicas –, a GM seguirá um caminho totalmente diferente e defenderá com unhas e dentes os elétricos a bateria.
Ao lado da primeira estarão Volkswagen, Toyota e GWM, outras fabricantes importantes no Brasil que também já estão investindo nos motores híbridos flex. Talvez Nissan e Renault, embora estas se mostrem ainda perdidas quanto aos seus interesses para um futuro em médio e longo prazo.
Já a segunda deve ter como grande aliada a Honda, com quem já firmou parceria global para o desenvolvimento de compactos elétricos de baixo custo – e que, portanto, pode ser beneficiária direta de uma possível produção local desses produtos.
Qual das duas se dará melhor? Qual dessas estratégias se mostrará a mais acertada? Essas são as perguntas não de milhões, mas de bilhões de reais, com B de bola. Ou melhor, de Brasil. Uma coisa é certa: esta singela guerra de gigantes vai ditar peremptoriamente o futuro de toda a indústria automobilística nacional a partir de… agora!