Era previsível que a seleção brasileira não teria, diante de Camarões, a sua mais brilhante apresentação na Copa do Mundo de 2022, tampouco a mais encantadora do ano ou, quiçá, da Era Tite. E, obviamente, o prognóstico não tinha base na escalação do time ou na possível queda de qualidade resultante dos 11 que entraram em campo. Todas as análises pré-jogo esbarravam na falta de entrosamento. Um time formado, que joga junto quase sempre, chega a este patamar de um jogador saber exatamente onde o outro se posiciona dentro de campo, de qual maneira pode passar ou lançar a bola ou, ainda, se pode deixar o adversário ser marcado por aquele companheiro. Um time formado para uma partida não atinge tal nível, por mais que os atletas se conheçam ou tenham jogado juntos alguma vez na vida.
A seleção brasileira que enfrentou Camarões usou a prerrogativa de ter 26 jogadores. Era um direito do treinador, que acreditou estar fazendo o seu trabalho direito. Porém, um time que não joga junto com frequência por vezes não joga junto. Junta 11 jogadores que jogam individualmente. E, quando acham que podem resolver sozinhos, time se perde. E perde. Não perde a primeira colocação no grupo (embora a tenha colocado sob forte risco), tampouco a vaga nas oitavas de final da Copa do Mundo, mas, se o time titular ainda está longe de jogar como uma orquestra, o reserva desafinou.
Faltou muito para o time reserva de Tite. Faltou pouco para o garantido primeiro lugar tornar-se segundo, o que obrigaria a seleção brasileira a encerrar a história de Cristiano Ronaldo em Copas do Mundo ou terminar a própria história no Catar.
O jogo
Eram três os adversários da seleção brasileira quando a bola começou a rolar: Camarões, a obrigação de Camarões de vencer a partida para só então pensar em classificação (e dá-lhe escola africana em campo) e o próprio time. Este terceiro não aparecia diante de um cenário de excesso de confiança de quem vinha de duas vitórias (embora tenha jogado bem somente no segundo tempo da partida contra a Sérvia) e começou a dar as caras conforme os minutos foram passando.
O futebol pode mudar, ficar mais moderno, tecnológico, profissional, mas a raiz jamais deixa de existir. E é ela a responsável pelo conceito de que quem está fora de um time tem um incessante desejo de entrar e não mais sair. O treinador brasileiro deu esta oportunidade a quase todos que começaram jogando. Estava claro que eles iam querer mostrar serviço, ou mostrar que serviam.
Só que a seleção brasileira que enfrentou Camarões não mostrou serviço como um time. Foi um tal de muita gente querer resolver tudo de maneira individual. Rodrygo foi um dos raros atletas a pensar no coletivo. Antony e Gabriel Martinelli excederam no individualismo. Gabriel Jesus, que por característica e função em campo precisava de uma filosofia mais coletiva, praticamente não conseguiu pegar na bola. Diante disso, a seleção brasileira criou alguma coisa, mas parou nesse excesso de individualismo.
Taticamente, Daniel Alves, de convocação controversa, tentou apoiar um pouco mais o ataque, algo comum em suas características. Parou na velocidade do jogo e no esquema tradicionalista de Tite, que muda as peças, mas não a maneira de jogar.
Do lado de Camarões, havia uma impressão de que o time pouco aprendeu na tal escola africana. Havia a velocidade, sobretudo para marcar os brasileiros, mas, para um time que dependia totalmente de uma vitória para só então pensar na possibilidade de uma classificação, as jogadas de ataque rarearam. Parecia haver uma preocupação maior em não sofrer gols.
Tite não quis saiu do tradicional nem quando poderia. A saída de Alex Telles por uma contusão e a entrada de Marquinhos poderiam levar Daniel Alves para o lado esquerdo, Militão para a direita e o jogador do Paris Saint-Germain compondo a zaga com Bremer. Não, mil vezes não, Troca seis por meia dúzia e mantém o mesmo padrão de jogo.
Entraram Everton Ribeiro, Pedro e Bruno Guimarães. Saíram Rodrygo, Gabriel Jesus e Fred. Raphinha ainda entrou no lugar de Antony. O comportamento do time não mudou. Leia-se individualismo.
Quando Camarões fez o que se esperava do time desde o início da partida, Aboubakar marcou de cabeça, após um belíssimo cruzamento vindo do lado direito e sem que fosse a ele necessário pular. É verdade que tirou a camisa e recebeu cartão vermelho, mas já havia jogado gelo na seleção brasileira.
O fim do jogo foi marcado pela preocupação com a Suíça não marcar mais um gol sobre a Sérvia, o que mandaria o Brasil para o segundo lugar do grupo. Os jogos acabaram antes disso, junto com a invencibilidade da seleção brasileira. Que o excesso de confiança tenha ido junto pois, caso contrário, “Dae Han Min Guk” será entoado em elevados decibéis. E a zebra é africana, não asiática.
A propósito: Bélgica, terceira colocada em 2018 e Alemanha, com o histórico, já foram. Copas mudam muitas histórias.
A Alemanha dos 7 a 1 em 2014 caiu na primeira fase em 2018 e 2022. A Bélgica da eliminação brasileira em 2018 caiu na primeira fase em 2022.
Praga de brasileiro pega…