Os dois temas que mais geram confusão no mundo motociclístico são: frenagem e pneus. A frenagem porque moto – assim como bicicleta – tem sistemas de freios separados para a roda dianteira e traseira e isso dá um nó na cabeça de muita gente. E pneus porque em pleno século XXI ainda tem gente que trata moto como se fosse um carro de duas rodas! Mas não é!
Um dos grandes absurdos que se espalhou é instalar pneu mais largo na roda traseira só pra ficar mais “bonito”. Aprenda: pneu não tem de ser bonito! Algumas fábricas até se esforçam para dar um aspecto mais elegante, porque pneus de motos ficam mais expostos do que os de carros. Mas a moto precisa inclinar para fazer curva e a largura do pneu traseiro tem muita interferência.
Ao contrário dos carros, que se apoiam em toda banda de rodagem, as motos tem a banda dos pneus em formato convexo justamente para permitir a inclinação. Alargar o pneu traseiro sem alargar a roda só piora a inclinação em curva. Viu? Motos não são carros de duas rodas. Pneus de motos só são eficientes na medida original, mesmo que seja fino.
Outra informação: são poucos os motociclistas realmente capazes de identificar as características de um pneu. Até mesmo profissionais do setor tem dificuldade e uma das profissões mais difíceis é de piloto de teste de pneus, porque precisa ser muito sensível, do tipo que até chora vendo comercial do Boticário.
Só para imaginar o grau de dificuldade de quem testa pneus, veja alguns dos atributos analisados: aderência em curva, aderência em frenagem, rendimento quilométrico, maneabilidade, ruído, drenagem (molhado), resistência à torção, conforto, rolagem, inclinação, detalonamento, velocidade entre outros.
Pois bem, aí me pego ouvindo motociclistas afirmando peremptoriamente que a marca de pneu X é muito melhor nas curvas do que a Y e que a Z é melhor na chuva do que a W e por aí vai…
Antes de mais nada saiba que na categoria top de pneus para motos de alta performance, todas as grandes marcas são boas, ótimas, excelentes. Não existe pneu ruim nessa categoria. Saiba também que só tem um jeito de
saber se um pneu é “melhor” em determinada condição do que outro: testando no mesmo dia, na mesma moto e sob mesmas condições.
Quando alguém troca o pneu e afirma que os novos deixaram a moto muito melhor nem se dá conta que tirou um pneu USADO e colocou um NOVO, qualquer um ficaria melhor.
Veja algumas dicas importantes
1) Pneus se trocam aos pares! Isso mesmo que você leu. Faça uma conta matemática simples: a moto rodou 8.000 km e torrou o pneu traseiro. Mas o pneu dianteiro parece novo, e “dá pra rodar mais um pouquinho”. Nada disso, porque os pneus são coisas que andam aos pares. Se o traseiro rodou 8.000 km o dianteiro rodou os mesmos 8.000 km. Se mantiver o pneu dianteiro e trocar só o traseiro, depois de 4.000 km o pneu dianteiro terá 12.000 km.
Aí a moto estará muito bem apoiada na roda motriz com um pneu meia-vida e perigosamente desestabilizada na dianteira com um pneu totalmente gasto. Imagine isso na chuva! SEMPRE troque os dois ao mesmo tempo, não importa a aparência do dianteiro é seu pescoço que está em jogo.
Tem mais: os pneus de motos se desgastam mais rápido do que pneus de carro. Isso é intencional porque os carros são apoiados em quatro pontos, se um falhar ainda tem três. Motos são apoiadas em dois pontos, se um falhar não tem nenhum porque não se equilibra só com um pneu. A ideia é trocar sempre para estar sempre novo.
2) Use sempre mesma marca modelo nas duas rodas! Outro erro comum é colocar um pneu X na frente e um Y na traseira. Pneus de moto foram feitos para andar aos pares. No seco nem dá muita confusão, mas no molhado o pneu dianteiro deixa uma marca no asfalto que irá encaixar com o sulco do pneu traseiro. Quando isso não rola acontece o que se chama de “crise de paridade”. Se observar bem irá notar que os sulcos do pneu dianteiro se repetem em algum ponto do pneu traseiro e isso é proposital.
3) Na chuva precisa reduzir a calibragem. Não! Todo pneu tem sulcos, também chamados de encavos. Estes sulcos são como calhas para a água da chuva. Então imagina a calha da sua casa. Digamos que ela tem 4 polegadas de diâmetro e a água da chuva passa por ela numa boa. O que aconteceria se você espremesse essa calha como se fosse um tubo de pasta de dente, reduzindo o diâmetro? Reduziria o volume de água a passar. Então, quando esvazia o pneu esses sulcos se fecham que nem as calhas e a capacidade de escoamento da água é menor, aumentando a chance de uma escorregada no molhado. Quando o engenheiro determinou a calibragem do pneu ele já previu o uso do pneu na chuva!
4) Ao trocar os pneus, deve-se trocar também as câmaras? Depende. Se a câmara estiver sem remendos – o que é quase um milagre – pode-se mantê-la. Se tiver remendos é melhor trocar para não comprometer o balanceamento. Atualmente as câmaras estão bem mais baratas e em alguns casos é até mais barato trocar do que remendar. Por outro lado, no caso de pneus sem câmara (tubeless), aconselho trocar os bicos de válvulas a cada troca de pneus porque não é caro e garante melhor vedação.
5) O pneu gastou mais de um lado, vou virar! Primeiro saiba que é normal o pneu gastar de forma irregular, principalmente o dianteiro. E não precisa mandar a moto pra alinhar, porque o motivo está no chão, ou melhor, no asfalto. As ruas tem uma pequena inclinação para permitir o escoamento da água da chuva. Como a moto se apóia em apenas dois pontos é normal o pneu gastar mais de um lado. Em função do processo de fabricação os pneus só podem rodar num sentido e por isso tem uma seta na lateral indicando o sentido de rotação.
Outro dado que pouca gente sabe: o pneu traseiro gasta mais rápido por causa da tração na roda motriz (traseira). Isso é normal. O que não pode de jeito nenhum (mas já vi muito por aí) é fazer rodízio de pneus!!! O pneu traseiro só pode andar na roda de trás. O pneu dianteiro tem a função de cortar a lâmina de água da superfície. O traseiro tem a função de dar tração. Se inverter, no piso molhado o pneu dianteiro não conseguirá drenar a água e pode aquaplanar. Em condições normais, com os pneus corretos, calibrados e novos é quase impossível uma moto aquaplanar.
6) Sopa de letrinhas. O que significam aquelas letras estampadas nas laterais dos pneus? Resumidamente tem alguns códigos alfanuméricos. Por exemplo: 90/90-18. O primeiro 90 indica a largura expressa em milímetros. O segundo número indica a altura (ou perfil) e o curioso é que essa medida não é expressa no sistema métrico, mas é uma porcentagem! Representa a proporção entre altura e largura. Neste caso a altura é 90% da largura. O terceiro número indica o diâmetro da roda expresso em polegadas, ou seja, 18 polegadas.
Outros códigos são: R (radial), TWI (tread wear indicator – indicador de desgaste), data de fabricação, capacidade de carga, velocidade máxima e tipo (com ou sem câmara). O TWI é uma seta que aponta a região da banda de rodagem que fica visível indicando a hora da troca. A capacidade de carga é expressa por números e depende de uma tabela do fabricante. A velocidade máxima é indicada por letras e também depende de uma tabela. Já a data de fabricação identifica a semana do ano que o pneu foi fabricado. Por exemplo: 1712, quer dizer 17a semana do ano 2012. Essa informação é importante porque pneus tem prazo de validade! Isso remete ao próximo ponto.
7) Pneus ficam velhos! Sim, não apenas gastos. Imagine uma moto que roda pouco, os pneus podem ficar velhos antes de ficarem gastos. Como são feitos de borracha, elas precisam contrair e expandir com o frio e calor. Depois de um tempo perdem essa propriedade e ressecam aparecendo pequenas rachaduras como uma porcelana craquelê. Quando chega nesse ponto o pneu deve ser trocado porque perde a capacidade de aderência. Mesmo que os sulcos ainda tenham profundidade.
8) Qual calibragem eu uso? A recomendada pelo fabricante DA MOTO! Por lei as motos e scooters devem ter a informação da calibragem em algum local visível. A única mudança é com relação a transportar passageiro ou carga. E muda apenas o pneu traseiro. Recomenda-se conferir a calibragem a cada 10 dias pelo menos. Sempre com os pneus FRIOS. É normal os pneus apresentarem um aumento de pressão depois de aquecidos, porque na atmosfera tem água, que se expande com o calor. Não “sangre” essa pressão excedente porque o fabricante já previu isso.
9) O principal fator de desgaste dos pneus é carga. Quanto mais massa transportar na moto ou scooter, maior será o desgaste. Quem roda muito com garupa ou carga certamente trocará o pneu mais cedo. O segundo fator é o tipo de piso. Quanto mais irregular, maior o desgaste. Ao contrário do que se pensa, no piso de terra o pneu gasta mais porque há séculos se sabe que areia é uma eficiente lixa (quem nunca ouviu falar em “arear” as panelas?). Em terceiro lugar vem a calibragem. Quando muito vazio a área em contato com o asfalto aumenta e o pneu se consome mais rapidamente.
E chega, porque não sou Moisés para escrever os 10 mandamentos!